8 de ago. de 2009

Cartazes - Lado B








Uma alegoria: Da Caverna



(Sócrates) Imagina a nossa natureza, relativamente à educação ou à sua falta, de acordo com a seguinte experiência. Suponhamos uns homens numa habitação subterrânea em forma de caverna, com uma entrada aberta para a luz, que se estende a todo o comprimento dessa gruta. Estão lá dentro desde a infância, algemados de pernas e pescoços, de tal maneira que só lhes é dado permanecer no mesmo lugar e olhar em frente; são incapazes de voltar a cabeça, por causa das algemas; serve-lhes de iluminação um fogo que se queima ao longe, num lugar superior, por detrás deles; entre a fogueira e os prisioneiros há um caminho ascendente, ao longo do qual se construiu um pequeno muro, ao estilo dos palcos de teatro de bonecos, para mostrarem as suas habilidades por cima deles.

(Glauco) Estou vendo.

-Figura também ao longo deste muro, homens que transportam toda a espécie de objetos, que o ultrapassam: estatuetas de homens e de animais, de pedra e de maneira, de toda a espécie de trabalho; como é natural, dos que os transportam, uns falam, outros seguem calados.

-Que situação estranha a dessas pessoas de que falas, Sócrates.

-Semelhantes a nós, Glauco. Em primeiro lugar, pensas que, nestas condições, eles tenham visto, de si mesmo e dos outros, algo mais que as sombras projetadas pelo fogo na parede oposta da caverna?

-Óbvio que não, se são forçados a manter a cabeça imóvel toda a vida.

-E os objetos transportados, não se passa o mesmo com eles?

-Sem dúvida.

-Então, se eles fossem capazes de conversar uns com os outros, não te parece que eles julgariam estar a nomear objetos reais, quando designavam o que viam?

-Acredito que sim.

-E se a prisão tivesse também um eco na parede do fundo? Quando algum dos passantes falasse, não te parece que eles não julgariam outra coisa, senão que era a voz da sombra que passava?

-Certamente que sim!

-De qualquer modo, pessoas nessas condições pensariam que a realidade fosse a sombra dos objetos.

-Necessariamente, sim.

-Considera, agora, o que aconteceria se eles fossem soltos das algemas e curados de sua ignorância, e vê se, uma vez que retornassem à sua natureza, as coisas se passariam desse modo. Logo que alguém soltasse um deles, e o forçasse a endireitar-se de repente, a voltar o pescoço, a andar e a olhar para a luz, ao fazer tudo isso, sentiria dor, e o deslumbramento iria impedi-lo de fixar os objetos cujas sombras via antes. Que achas que ele diria, se alguém lhe afirmasse que até então ele só vira coisas inúteis e ilusórias, mas que agora estava mais perto da realidade e via de verdade, voltado para objetos mais reais? E se ainda, mostrando a eles cada um desses objetos que passavam, o forçassem com perguntas a dizer o que era? Não te parece que ele se veria em dificuldades e suporia que os objetos vistos antes eram mais reais do que os que agora lhe mostravam?

-Muito mais!

-Portanto, se alguém o forçasse a olhar para a própria luz, seus olhos doeriam e retornaria para buscar refúgio junto dos objetos para os quais podia olhar, e julgaria ainda que estes eram na verdade mais nítidos do que os que lhe mostravam?

-Com certeza.

-E se o arrancassem dali à força e o fizessem subir o caminho difícil até acima, e não o deixassem fugir antes de o arrastarem até à luz do Sol, não seria natural que reclamasse por ser arrastado assim, e, depois à luz, com os olhos deslumbrados, nem sequer pudesse ver nada daquilo que agora dizemos serem os verdadeiros objetos?

-Não poderia, de fato, pelo menos de repente.

-Necessitaria habituar-se, eu acho, se quisesse ver o mundo superior. Em primeiro lugar, olharia mais facilmente para as sombras, depois disso, para as imagens dos homens e dos outros objetos, refletidas na água, e, por último, para os próprios objetos. A partir de então, seria capaz de contemplar o que há no céu, e o próprio céu, durante a noite, olhando para a luz das estrelas e da Lua, mais facilmente do que se fosse o Sol e o seu brilho de dia.

-É mesmo...

-Finalmente, eu acho, seria capaz de olhar para o Sol e de o contemplar, não já a sua imagem na água ou em qualquer lugar, mas a ele mesmo, no seu lugar.

-Necessariamente.

-Depois, já compreenderia, acerca do Sol, que é ele que favorece as estações e os anos e que tudo dirige no mundo visível, e que é o responsável por tudo aquilo de que eles viam uma cópia imperfeita.

-Com certeza, ele chegaria a essas conclusões.

-E então? Quando ele se lembrasse da sua primitiva habitação, e do saber que possuía lá, dos seus companheiros de prisão desse tempo, não crês que ele ficaria feliz com a mudança e acharia inferiores os outros?

-É claro que sim!

-Você acha que ele teria saudade da vida que levava junto deles lá embaixo, em meio a ilusões?

-Claro que não! Preferiria sofrer tudo a voltar a viver daquela maneira.

-Imagina ainda o seguinte. Se um homem nessas condições descesse de novo para o seu antigo posto, não teria os olhos ofuscados pela escuridão, ao regressar subitamente da luz do Sol?

-Com certeza.

-E se lhe fosse necessário julgar daquelas sombras em competição com os que tinham estado sempre prisioneiros, no período em que ainda estava ofuscado. Antes de adaptar seus olhos ¾e o tempo de se habituar não seria pouco¾, acaso não causaria o riso, e não diriam dele que, por ter subido ao mundo superior, estragara seus olhos, tendo a visão prejudicada, e que não valia a pena essa mudança? E a quem tentasse soltá-los e conduzi-los até em cima, se pudessem agarrá-lo e matá-lo, não o matariam?

-Matariam, sem dúvida.

-Meu caro Glauco, este quadro que te ilustrei deve ser aplicado a tudo o que dissemos anteriormente, comparando o mundo visível através dos olhos à caverna da prisão, e a luz da fogueira que lá existia à luz e à força do Sol. Quanto à subida ao mundo superior e à visão do que lá se encontra, se a tomares como a ascensão da mente ao mundo inteligível, verás que essa alegoria que fiz é verdadeira. Pois, segundo entendo, no limite do que se pode conhecer é que se avista, com muita dificuldade e esforço, a idéia do Bem; e, uma vez avistada, compreende-se que ela é para todos a origem de tudo que há de justo e belo; que, no mundo visível, foi ela que criou a luz, da qual é senhora; e que, no mundo inteligível, é ela a senhora da verdade e da inteligência, e que é preciso vê-la para que possamos ser sensatos na vida particular e pública.

-Concordo, até onde posso seguir a tua imagem.

-Temos então de pensar o seguinte sobre esta matéria, se é verdade o que dissemos: a educação não é o que alguns dizem que ela é. Dizem que conseguem introduzir conhecimento numa mente em que este não existe, como se introduzissem a visão em olhos cegos.

-Dizem, realmente.

-A presente discussão indica a existência, na mente, dessa faculdade (o intelecto) pela qual aprende; como um olho que não fosse possível voltar da escuridão para a luz, senão juntamente com todo o corpo, do mesmo modo essa faculdade deve ser desviada, juntamente com a mente toda, das coisas que se alteram, até ser capaz de suportar a contemplação do Ser e da parte mais brilhante do Ser. A isso chamamos o bem. Ou não?

-Sim, chamamos.

-A educação seria, por conseguinte, a arte desse desejo, a maneira mais fácil e mais eficaz de fazer essa faculdade voltar, não de a fazer obter a visão, pois já a tem, mas, uma vez que ela não está na posição correta e não olha para onde deve, dar-lhe os meios para isso.

Bibliografia: Platão, A República; tradução de Ana Lia de Almeida Prado; Martins Fontes, 2006


Ontem:

No Livro VII desta obra de Platão, temos a Teoria das Idéias, alegorizada no mito da Caverna e que ilustra a natureza do conhecimento pleno e verdadeiro, que Sócrates julgava ser indispensável aos filósofos, assim como para os guardiões governantes de cidade ou nação. Insinua-se também a viabilidade da uma cidade perfeita, que só pode existir de fato se tiver filósofos como. Um outro tema é natureza do conhecimento verdadeiro e a existência de dois mundos – o do visível e o do inteligível – sendo que o segundo possui o conhecimento das idéias e contém a plenitude das essências, sendo imutável. Já o primeiro abriga apenas cópias dessas idéias, contendo aquilo que ele chama de imperfeições, de modo que nele reina a opinião e não sendo possível nele se chegar a qualquer conhecimento verdadeiro. Ele é mutável, abriga variações que turvam a visão da inteligência, atravancando o conhecimento das idéias. Para Platão, deve-se educar nos futuros governantes tanto o corpo quanto a alma, levando adiante esses trabalhos apenas com os que

se mostrarem aptos a aprender, pois para governar a cidade perfeita, nada menos que o conhecimento da idéia do bem e do pleno mundo das idéias é requerido.


Hoje:

Parece que para a insatisfação dos especialista em filosofia Platônica a Alegoria da Caverna recebeu recentemente uma outra interpretação, porém, um pouco mais contextualizada. Pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais perceberam que a Alegoria da Caverna de Platão teria outro sentido na metafóra, mais a ver com o orfismo, o berço do espiritismo. O “sair da caverna” seria sair do corpo, desencarnar. Ver o mundo que não se consegue ver é ver o mundo espiritual. A luz que cega vinda da fogueira e que está na porta da caverna é a misteriosda luz que se vê entre a passagem desse mundo para o outro. E não conseguir comunicar o mundo existente lá fora para os homens de dentro da caverna é o mito da reminiscência, ou seja, o homem ao voltar para seu corpo ele esquece tudo. É o voltar da Caverna como na tarefa do filósofo postulado a governante da Pólis na República de Platão.Portanto nessa Hermenêutica a Caverna nada mais é que o corpo-humano. Platão recebeu fortissima influêcia dos Pitágoricos e herdou como consequência o Orfismo que acredita na reencarnação e na vida pos-mortem. E toda aquela antiga interpretação de se atingir a sabedoria suprema o Nous era só uma intrpretação pessoal que os filosofos queriam escutar. Platão talvez quizesse comunicar suas experiêcias no mundo espiritual e porém não podia falar abertamente pelo medo de morrer como corrompidor da juventude como Sócrates. Então como belo escritor usou de seus recursos literários para se falar da experiência. Assim como no Brasil na Ditadura e os Tropicalistas. Será então que Platão viajou fora de seu corpo? Será que Platão tinha conciência da vida espiritual, do mundo das almas?Será?

(fonte[hoje]:http://rafaelfonseca.wordpress.com)